domingo, 19 de dezembro de 2010

Chuva

 

 Tenho saudades da chuva. De como de repente tudo se torna meio-turvo, desimportante, e se enche de cinzentos e silêncios cobertos da sabedoria que traz a solidão. De ver a cidade salpicada de manchas coloridas, que transeuntes apressados seguram em riste, e luzes amareladas que avançam devagarinho em filas de trânsito de fim improvável. Das roupas ensopadas, frias, coladas à pele, de como transformam o vento num inimigo, conta de multiplicar de cujo resultado queremos fugir; do sabor que tem despi-las, para entrar numa casa de banho envolvida em vapores, de deixar a água quente acariciar os cabelos, o pescoço, o rosto voltado para cima, para um céu agora invisível, mas que se adivinha coberto de nuvens negras. Da toalha previamente aquecida, do seu cheiro a lavado, do seu toque quente, enfeitiçado. Do gosto do leite achocolatado entre cobertores e páginas cobertas de hieróglifos que devoramos com a avidez dos curiosos. De adormecer ao som de valsas compostas por gotas, telhas e persianas, e audiências de árvores semi-despidas que aplaudem entusiasmadamente. Dos sonhos que traz no regaço, quando os olhos começam a fechar e o ar a sair mais devagar, mais pesado. De acordar com uma sensação de calma, com uma moleza inexplicável que nos diz que o dia está frio, e nos seduz de novo para os lençóis. Do cheiro a terra molhada que se propaga pela cidade, quando horas depois desafiamos finalmente o labirinto de poças que se estende pelos caminhos. Do ar cansado, desanimado daqueles que não a conseguem compreender, que relembram o verão com a saudade e a tristeza de quem não o aproveitou. Dos farrapos de luz que provém dos prédios distantes, contrastando com o cinzento dos dias, e que fazem do tempo uma fotografia perdida em memórias de pessoas distantes, viajando por outros mundos.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Mowię trochę po polsku

Sędzia Virginia Phillips z San Diego uznała politykę dyskryminacji gejów i lesbijek w wojsku za sprzeczna z konstytucją.
Foi a primeira frase de uma notícia que consegui ler por inteiro (claro, com a ajuda do meu słownik, ou dicionário). Foi a semana passada, se não me engano, e depois disso tive duas conversas inteiramente em polaco, com a senhora da limpeza da minha faculdade (que agora é minha amiga) e com um ser que me perguntou as horas na paragem do tram. O que é que significa? Significa que já não "nie mowię po polsku", mas "mowię trochę po polsku". E sabe tão bem!

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Coisas da Neve

Basta um dia, doze graus negativos e uma tempestade de neve para a nossa perspectiva sobre o Inverno mudar completamente. Não me interpretem mal, ainda não odeio o Inverno. Simplesmente aprendi coisas que vão totalmente contra as ideias que tinha formado sobre tudo isto.

 Primeiro, percebi porque é que o Pai Natal tem sempre aquele ar bonacheirão, com as bochechas vermelhinhas. Não se trata de felicidade excessiva, como acontece com as crianças que correm o dia todo de um lado para o outro. É culpa do frio. bastam cinco minutos lá fora, para se ganhar um par de tomates na cara, ou no nariz, ou na testa, ou, com algum azar, em todo o lado.

E é aqui que se altera a minha ideia sobre a neve e o frio. Pensava eu que eram totalmente opostos à praia, ao calor do verão, mas estava enganada. Também no verão as pessoas ficam vermelhas, e a neve não é assim tão diferente da areia. Vejamos: Acordei esta manhã depois da tempestade, e demorei mais quinze minutos do que o costume a chegar à faculdade, pois é tão difícil caminhar sobre a neve como sobre a areia. E quando o vento empurra os flocos brancos para a nossa boca, a sensação é similar à de comer areia, porque, quando a neve cai, não parece húmida, tanto que se torna difícil moldá-la para fazer bolas, outra ideia errada que eu tinha. E se formos a ver, as brincadeiras são semelhantes - quem salta as dunas, escorrega por montes de neve, quem faz croquetes, rebola pelo chão branco, quem constrói castelos, constrói bonecos.

Foi isto que se passou ontem à meia-noite, algures pela Polónia, quando um grupo de cinco ou seis pessoas decidiu sair para a tempestade de neve  que a noite trouxe, para fazer uma batalha, não com o tempo, mas uns com os outros. E o pior foi no fim descobrir que, o cabelo congelado, todos pintados de branco, o corpo dorido do frio, não sabe bem entrar em casa, que o contraste frio-quente faz doer a cara e as mãos.