quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Łódź

Fim de semana prolongado - sexta-feira, livre; segunda, feriado; terça, tolerância de ponte nas faculdades, um hábito comum na Polónia, para que os alunos tenham tempo para ir a casa. Parece-me uma ideia mais que óptima, umas mini-férias nunca fizeram mal a ninguém. E que melhor maneira para aproveitar o tempo que viajar? 

Vejo-me assim no meio de uma estação apinhada de gente à espera para comprar os bilhetes. O dia 1 de Novembro é o dia de todos os santos, um dia muito importante para os habitantes deste país, que se deslocam assim às suas terras-natal, para saudar os seus falecidos. Coloco-me na fila mais curta, mas mesmo assim estão umas trinta pessoas à minha frente. Falta meia hora para o comboio, e de certa forma sei que não vou conseguir. A confusão é muita. Há pessoas a passar de um lado para o outro,  atrás de mim, à minha frente, a tentar colocar-se nas filas que mais lhes convém. As malas rebolam por cima dos meus pés, contra as minhas pernas, as pessoas empurram, umas mais gentilmente, outras mais à bruta. Faltam quinze minutos, a linha à minha frente não parece ter sequer mexido. Largo tudo e corro para o cais de embarque, o bilhete, compro-o no comboio. 

No cais, mais um mar de gente. "Matem alguém se for preciso, diz a minha parceira de viagem, mas entrem no comboio!". O motivo de tal aviso? Na Polónia os bilhetes têm uma validade de dois dias, pelo que arranjar lugar num fim-de-semana em que toda a gente parece estar a viajar, é uma pequena guerra civil. O comboio aproxima-se, as pessoas apertam-se. Corro para a porta. "Avariada". Corro para a outra. Está muita gente à minha frente, mas consigo entrar. Três lugares vazios. Perfeito. Mas nem todos têm a mesma sorte, e entre as cadeiras, há quem viaje em pé.

Quatro horas e meia de viagem até Łódź. No entanto, o fim-de-semana promete. Viajo com duas raparigas croatas, e juntar-no-emos a  mais um rapaz croata, que nos dará alojamento. Uma portuguesa entre croatas. A ideia não me assusta. Estou mais que habituada a estar entre os turcos, as espanholas, e, claro, entre polacos. Não perceber o que se fala à minha volta já faz parte do meu dia-a-dia, e de resto, fala-se inglês, que já vem tão espontaneamente como o português. 

Łódź foi uma cidade industrial, pelo que não há belos monumentos para serem vistos. Há, essencialmente, fábricas antigas e parques, e uma pequena zona associada ao Holocausto. Está situada em Łódź a última estação de comboio a levar judeus para Aushwitz, assim como o último ghetto judeu. Infelizmente, não cheguei a visitar estes espaços, mas há outras coisas para ver. Na Ulica Piotrkowska, a rua principal, as casas têm uma particularidade interessante - cada andar foi construído num estilo diferente, provavelmente para mostrar a riqueza da cidade. Também abundam, aqui, as estátuas dinâmicas, como eu lhes chamo, e que é como quem fala naquelas estátuas em que é possível interagir com as personagens - de destacar a estátua de um escritor que criticou a cidade e a sua governação, e que é agora detestado pelos habitantes, que pisam o pé da estátua e lhe apertam o nariz sem reservas, como bem se pode ver pela alteração de cor nestas zonas.

Ao centro da estrada, bem entre as faixas destinadas ao trânsito, há uma faixa com os nomes de todos aqueles que contribuíram para a construção rua. Estacionados junto ao passeio, carrinhos empurrados por homens em bicicleta, algo diferente, e, provavelmente, agradável de se experimentar. Algures a meio da Piotrkowska, a escola de cinema de Łódź, em frente da qual o passeio se reveste de estrelas com os nomes de actores e realizadores importantes que ali estudaram. Roman Polanski é um deles, sendo que este tem ainda direito a uma rua sua, não porque o Estado tenha decidido dar-lha, mas tão somente porque ele a decidiu comprar, um dia. 

Nomes inscritos no chão é uma coisa comum em Łódź, portanto. Falo agora do Memorial Park, um parque feito em memória do Holocausto. Desta vez, o protagonismo é dado aos judeus que sobreviveram e que estiveram presentes na abertura do parque, quatrocentos e poucos de número, e a todos aqueles que ajudaram a salvar os judeus, adoptando-os como seus filhos e dando-lhes, assim, identidade ariana, sujeitando-se a morrer juntamente com o resto da família. 

Mas mudemos para coisas mais alegres. Temos a Opera, espaço aproveitado para umas skatadas, devido ao piso lisinho, às escadas e aos curbs que por ali se encontra. Infelizmente os skaters estão a almoçar, sentados à sombra de umas árvores, que hoje até está sol, e a temperatura chega aos quinze graus. Do edifício sai música clássica, e rio, ao pensar na Casa da Música e como é quase irónico  que espaços dedicados a este tipo de musica acabam por se ligar à cultura de rua. Mas, música é arte, e as artes sempre estiveram interligadas.

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